Com apoio do Labora, sindicato de entregadores cria Secretaria da Mulher e LGBTQIA+

Mais de 200 mulheres assinaram a ficha de filiação ao Seambape (Sindicato dos Trabalhadores Entregadores, Empregados e Autônomos de Moto e Bicicleta por Aplicativos do Estado de Pernambuco) desde a criação, em junho, da Secretaria da Mulher e LGBTQIA+ da entidade. A nova pasta foi criada com recurso do edital Fortalecendo Trabalhadores Informais promovido pelo Labora – Fundo de Apoio ao Trabalho Digno em parceria com Laudes Foundation, Fundação Ford e Open Society Foundations. A informação foi compartilhada com a equipe do Labora pelo presidente do sindicato, Rodrigo Lopes, em visita à sede do Fundo Brasil no último dia 19 de outubro.

O Seambape disponibiliza às entregadoras cursos de formação política e de qualificação profissional. No primeiro, são convidadas a fazer uma análise crítica das condições de trabalho e dos direitos assegurados na CLT e ignorados pelas empresas. No segundo, recebem orientação sobre direção defensiva e legislação do trânsito. “Com o apoio do Labora, conseguimos alcançar as trabalhadoras, criar um ambiente de acolhimento dentro do Sindicato”, disse a liderança dos entregadores.

Rodrigo Lopes integra o grupo de trabalho criado pelo governo federal no início deste ano para discutir a regulamentação da categoria. Nos dias 5 e 6 de outubro, participou do seminário promovido pelo Labora para debater os caminhos e desafios para a promoção do trabalho digno no Brasil.

No painel Precarização e informalidade no Brasil: uma luta por trabalho digno, compartilhou com as 39 lideranças de organizações apoiadas pelo fundo uma reclamação das entregadoras de aplicativos: a falta de adaptação das bags , forma como as mochilas são chamadas, aos corpos das mulheres. “Muitas deixam de trabalhar porque, no período pré-menstrual, as alças machucam os seios”, comentou. A demanda trazida pelas trabalhadoras se tornou uma das bandeiras de luta do movimento.

Rodrigo Lopes contou às lideranças de todo o país como é participar do GT do governo federal. Foto: Airan Albino /Acervo Fundo Brasil

A atuação com entregadoras e entregadores mulheres e LGBTQIA+ está permitindo ao Seambape compreender as demandas específicas de gênero. “A gente conheceu cinco mulheres trans que, por causa da baixa remuneração com as entregas, encaram a jornada dupla de trabalho. Durante o dia, trabalham de moto e à noite prestam o trabalho sexual para complementar a renda. Uma rotina que, pelas noites mal dormidas, deixam elas ainda mais vulneráveis a acidentes de trânsito”.

A despolitização e descrença da categoria são, segundo Rodrigo, os maiores desafios do sindicato de entregadores na tarefa de mobilização para a conquista de direitos. Nos cursos, ele reitera a remuneração por hora trabalhada com a assinatura da carteira de trabalho. Este é um dos direitos assegurados pela legislação trabalhista e não efetivados pelas empresas. “Eu converso com a base, explico que existe o trabalho intermitente, que você pode receber por hora. A base diz: “é conversa”. Hoje, é preciso lutar contra o lobby de desinformação produzido pelas empresas. O Labora tem nos ajudado a levar informação para a formação política da classe trabalhadora”.

Se no final dos anos 70, multidões de trabalhadoras e trabalhadores eram mobilizadas nas portas das montadoras de automóveis na histórica Greve do ABC, hoje, o líder dos entregadores aposta na comunicação, nas redes sociais. “Já era o tempo que a gente ia em porta de fábrica. A minha categoria está na rua, nos pontos. Nós é que devemos ir atrás dessas pessoas. Temos que tocar o sentimento da trabalhadora e do trabalhador”, disse ele.

O resultado da estratégia de focar nos esforços nas redes sociais está nos números. Um vídeo que convoca o breque (paralisação) para a luta por melhores condições de trabalho soma mais de 116 mil visualizações no Instagram do Seambape.

A hora logada e a precarização do trabalho

O sindicalista contou ao público presente no seminário promovido pelo Labora como são os embates dentro do GT em Brasília para conquistar e assegurar direitos. Segundo Rodrigo Lopes, as empresas de aplicativos ignoram as demandas das trabalhadoras e trabalhadores, uma evidência do aprofundamento da precarização do trabalho.

Hora logada é uma das bandeiras do movimento de entregadores. Foto: Airan Albino / Acervo Fundo Brasil

Os donos dos aplicativos insistem em considerar, para a hora trabalhada, apenas do momento que o entregador recebe o aviso do pedido até a chegada no local de trabalho; o tempo que o entregador fica à espera é descartado. O Seambape luta para que os 1,7 milhão de entregadores em todo o país recebam pela hora logada, desde o momento que começam a rodar com as motos e bicicletas pelas ruas das cidades. A categoria reivindica R$35,76 pela hora logada, mas as empresas acenam com apenas R$10,20 pela hora que entendem como de trabalho.

“Um jovem de 22 anos perdeu a perna em um acidente de trabalho e não pode mais pilotar. A empresa de aplicativo de entrega se recusa a pagar o seguro. Alega que, quando o acidente aconteceu, o trabalhador não estava com pedido na tela do celular. Como fica a vida deste jovem e da família dele? Se a gente não se unir, não lutar, é daqui para pior”, ressaltou.

Contribuição previdenciária, um avanço

Ao fim do painel, Lopes anunciou uma conquista da classe dos entregadores obtida nos embates com o empresariado dentro do GT criado pelo governo federal. “Foi fechado um acordo com as empresas [de aplicativos] sobre a contribuição do INSS: 27,5% vão ser retidos para o governo federal. 20% serão as empresas e 7,5% serão contribuição do trabalhador”, contou. Os recursos, segundo o presidente do Seambape, serão fundamentais para a regulamentação da profissão e garantia de uma rede de proteção social.

“As emergências dos hospitais estão lotadas de entregadores que ficam seis, sete meses parados sem direito a nada. A gente ainda precisa avançar muito mais. Ter novas lideranças, novos Rodrigos. Enquanto minha saúde permitir, eu vou lutar até o fim”.